quinta-feira, 2 de junho de 2016

A TEMPESTADE


A tempestade


Sou o menino ateu,
você a madre superiora,
você é Franco,
eu a Frente Popular,
você a ditadura,
eu a vanguarda,
você é o deserto,
eu sou a tempestade.


Sou Iansã,
você a Virgem Maria,
eu sou o titã,
você o fantasma,
sou a espada flamejante,
você o escudo de aço negro,
sou bomba-relógio,
você o tempo,
você é a funcionária pública,
eu o bárbaro aventureiro.


Sou meretriz,
você poeta,
sou inculto e belo,
você erudita.


Sou o endividado,
você o cobrador,
sou o sonho,
você o despertador.


Você é o herói da justiça,
eu sou o príncipe dos ladrões,
sou a vingança do povo,
você o carrasco mascarado.


Sou Robespierre,
você Napoleão,
eu a realidade,
você a miragem,
sou o Rei dos Reis,
você é Cristo,
sou vida plena,
você sepultura,
você o atraso,
eu o futuro.


Sou Lampião,
você o xerife,
você o cowboy,
eu o cacique.


Sou um errante filisteu,
você o virtuoso hebreu,
você odeia o pecado,
sou o pecador sem redenção.

sábado, 28 de maio de 2016

A TRADIÇÃO


A Tradição


Verba volant, scripta manent,
indico nesta epístola,
um pouco de nossas práticas,
costumes e ideias que se repetem,
em formas diversificadas,
é também um recado,
que tu verás de mal grado,
mas deves ler preocupado,
pois deves perceber,
nosso imenso poder,
criamos o patriarcado,
a primogenitude,
a propriedade privada,
e também a herança,
neste nosso clã,
somos todos traidores,
mas fiéis à tradição,
nossa fidelidade canina,
é para com a soberba desrazão,
apunhalamos pelas costas,
delatamos o salvador,
não importa quanto dor,
nossa ação causa aos inocentes,
pois os nossos interesses,
tingidos de glória.
a escolha mais óbvia.
dourada resplandecente,
surge espontaneamente.
Meu caro,
é imenso,
todo esse consentimento!

quarta-feira, 25 de maio de 2016

DRAGÕES DO VIL METAL


Em grandes cavernas,
em castelos abandonados,
em amplos salões,
de tetos abobadados,
escamas avermelhadas,
do sangue de suas vítimas,
usam da força bruta
dispensam as artes místicas.


Dragões do vil metal,
por muito tempo construíram,
(enquanto a paz destruíam)
um brilhante cabedal.


Porém,
aparenta a cobiça,
ser então infinita,
cai flamejante,
a fúria retumbante.


Jaz o velho bosque,
outrora verdejante,
em brasas retorcidas,
travessias e vilas,
em pó ou ruínas,
assim se faz a sina,
deste tal legado,
quiçá consumado,
deixar tudo revirado,
em desventura desolado.


Chora então o profeta,
ademais agoureiro,
sua vitória mais cinza,
o dito certeiro.


Feito verso e prosa,
nos lares replicado,
sacrifício delicado,
renúncia duvidosa:
casto relicário,
avulta graciosa,
feito voluntário
desvanecem convalidas
em prol das feras ditas.


Das terras nobre senhor,
sob guarda decidida,
pois alma tão sofrida,
acalenta velha dor,
cada homem assim se faz,
cavaleiro contumaz,
pois de tal juízo,
faz-se o final,
e sem muito siso,
e mais recear,
pois então aumentar,
a carga o tributo,
e sem muito luto,
ao ser entregar,
e ratear diminuto,
vasto salvo-conduto.


Cisma incessante,
el rei hesitante,
não surge o bem-dito,
ecoa sibilante,
e ainda ululante,
das terras do aflito,
assim se faz do grito,
ademais veredito.


Dragões do vil metal,
apesar das oferendas,
desfaz-se o acordo,
ignora-se o trato,
faz por agrado,
o inverso do belo,
caos e flagelo.


Entre os homens,
traição e desistência,
mas nunca cessa e mais avança,
mistério e aliança,
luta e resistência.

domingo, 1 de maio de 2016

VERTIGEM


VERTIGEM



Dos ouvidos e olhos,
o coração e a mente,
deveras exigem,
esconder febrilmente,
a louca vertigem,
o cair plenamente.


O coração e a mente,
querem taticamente,
mas é desesperadamente,
tal qual escuro palco,
do vermelho teatro bélico,
desconhecer o mefistofélico,
desfazer ilusoriamente,
o truque maquiavélico.


Afastar intensamente,
a lebre soturna decadente,
a paixão ardente,
ainda é desejo da mente.


Não desejo ver,
prateada velozmente,
voadora, a raposa,
a paz desprover.


Os ratos tudo tentam,
e tenazmente ostentam,
o total desencanto,
gerando o mal pranto,
destruir usando hordas,
alcateias sarcásticas,
togadas... midiáticas.


Antes,
bem dormir preciso,
antes do mal incisivo,
do tipo ruim corrosivo,
bela, recatada e letal,
jovem e boa esposa, fatal,
exortada cabalmente,
pelo querido mais crente,
acionado tragicamente,
lançando-me sem proteção,
na mais eterna escuridão.


quinta-feira, 14 de abril de 2016

SAUDADES DO JOAQUIM



Joaquim,
cativos eram seus antepassados,
comprados, acossados,
pelo ex-pirata Barba-Ruiva,
tornou-se da Casa-Grande,
servo leal afamado.


Capataz brutal,
de nome Gilmar,
a glória capital,
de forma viril
com ele disputava.

Joaquim sente saudade,
de quando era lembrado.
Disputar espaço,
com Zé beato,
velho ladino,
agora é seu destino,
com augusta fé
em notas de rodapé.

Por outro servo,
cuja aparência e conduta
aos patrões agrada mais,
fora trocado,
pois se quer astuta,
as velhas criaturas.

O que é pestilento,
estes comensais,
de perigosos umbrais,
invocam terrivelmente.

Também de vil forma,
encarnam loucamente,
o desejo inconsequente,
dos grandes bacanais.

sábado, 12 de março de 2016

A BRUXA. O terror da opressão religiosa.

(Aviso: spoiler). A história, a tensão e o cenário do filme lembrou-me muito o filme Anticristo, de Lars von Trier. No filme Anticristo, a personagem feminina se convence de que a natureza e o feminino são elementos cruéis. O fim do filme de Lars von Trier indica que a natureza também tem seu lado protetor. No filme A Bruxa, sentimos a tensão gerada pela opressão dos desejos, sentimentos e instintos humanos. Quando a jovem aceita o demônio e junta-se às bruxas, a tensão e a opressão desaparecem. A jovem respira aliviada e serenamente. As mulheres a levitar indicam a leveza em contraposição à tensão e opressão religiosa.

Algumas questões ou mistérios parecem não ter respostas.  Como o bebê foi raptado? Existiam bruxas próximas ou era sonhos ou pesadelos dos personagens? O marido era subserviente à esposa, nutria por ela excessiva cautela ou se tornava frágil ao entrar em contradição entre salvar a família da fome e demonstrar ser um homem bom, corajoso e honesto? Parece-me que o marido culpa-se pelo fato de sua família ter sido expulsa do vilarejo e que ele tem uma origem mais humilde.

O fanatismo religioso costuma unir as pessoas, no entanto, o orgulho e fanatismo religioso do marido levou sua família ao isolamento. Talvez desejasse fundar no futuro uma nova comunidade e se tornar um líder religioso, mas uma série de infortúnios indicava que a crença no deus provedor devia ser revista. A tentação de revisar, de diminuir ou afastar a crença é vista pelo casal como obra do demônio. 

A jovem do filme A Bruxa e a viúva do filme Babadook aceitam a convivência com o monstro ou com o demônio, aceitam e compreendem parte da força de seus próprios desejos e anseios, ou seja, obtêm-se algo libertador, superam a excessiva opressão que aprisionava, sufocava e escondia seus sentimentos e instintos.

sábado, 9 de agosto de 2014

Sob o Sangue dos Hereges


Abelardo é um combatente português que foi designado para proteger missionários no interior do Brasil no século XVI, durante o reinado de Dom Sebastião. O texto é escrito em primeira pessoa pelo personagem Abelardo e destina-se a seu amigo sacerdote que vive em Évora. Para proteger os jesuítas, Abelardo deve enfrentar inclusive forças diabólicas e inquietações espirituais. A situação, já tensa, fica ainda mais complicada com a chegada de místicos europeus.